Falta Rivotril na república dos benzodiazepínicos

No Brasil falta tudo: falta hospital, falta professor, falta ônibus que chegue no horário. Agora falta até Rivotril. E a notícia é séria: farmácias de capitais e no interior estão sem estoque. O calmante nacional, que já é patrimônio imaterial da insônia brasileira sumiu das prateleiras. A Biopas, fabricante, explicou que é por conta de mudança de fábrica. No Brasil, tudo muda de lugar: indústria, ministro, técnico da seleção. Só a ansiedade continua firme, sem prazo de validade. A versão em gotas só volta no fim de 2025, a sublingual, apenas em 2026. Enquanto isso, resta o comprimido. É a dieta oficial da República: mastigar o estresse até que passe. Ou até que piore.

Os especialistas garantem que o genérico é igual. A frase, aliás, é a melhor definição do país: tudo igual, só que diferente. É o Brasil genérico: dos políticos genéricos, com promessas genéricas e até de indignação genérica. E o povo? O povo segue sem dormir. O rico, de medo de sequestro. O pobre, que ao invés de contar carneirinhos conta boletos vencidos e cada vez mais taxas públicas. O político, de conchavo e do receio da batida na porta às seis da manhã. O eleitor, de raiva. Brasília, claro, não sofre com falta de calmante: lá, o benzodiazepínico é constitucional e atende pelo nome de foro privilegiado. Dose única, efeito prolongado, quatro ou oito anos.

Pacientes, usuários ou adictos, não sei como nominar, estão reclamando, especialistas explicando, e autoridades em silêncio. O resumo é um só: falta calmante porque sobra motivo pra tomar calmante. E o Brasil confirma sua vocação: somos todos cidadãos da república dos benzodiazepínicos. Quem não toma, precisa. Quem toma, dobra sempre  a dose. Quem fabrica, some. E quem governa, ronca. No fim, só restam duas certezas: a insônia não acaba e o humor, se não curar, ao menos nos mantém acordados.

 

Fabrício Correia é escritor, jornalista e produtor cultural. Escreve para o jornal Gazeta Popular, todas as sextas-feiras. É membro da União Brasileira de Escritores.

 

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