“Ela é o Diabo” (1989) é uma comédia de humor negro dirigida por Susan Seidelman, conhecida por seu toque peculiar em filmes como “Procura-se Susan Desesperadamente”. Baseado no romance de Fay Weldon, “The Life and Loves of a She-Devil”, o filme narra a saga de Ruth Patchett (Roseanne Barr), uma dona de casa comum cuja vida dá uma guinada drástica após ser traída pelo marido.
Roseanne Barr, então no auge de sua popularidade graças ao sucesso da série “Roseanne”, nos mostra uma Ruth Patchett que começa como uma dona de casa desajeitada, presa na monotonia de sua rotina diária e constantemente desvalorizada por seu marido, Bob (Ed Begley Jr.). Barr capta com maestria a dor da rejeição e a determinação vingativa que se segue. A transformação de Ruth, tanto física quanto emocional, é um ponto central do filme, e Barr lida com essa transição com uma habilidade que combina vulnerabilidade e força.
A vida de Ruth muda drasticamente quando descobre que seu marido, Bob, está tendo um caso com Mary Fisher (Meryl Streep), uma escritora de romances de sucesso que vive em um mundo de luxo e glamour. Streep, em um papel que diverge de seus típicos dramas intensos, brilha como a vaidosa e superficial Mary. Sua interpretação é uma delícia de se ver, cheia de nuances cômicas que trazem um charme irresistível à sua personagem, mesmo quando ela é a fonte do sofrimento de Ruth.
Ed Begley Jr., como Bob Patchett, desempenha o papel do marido infiel com uma combinação de arrogância e miopia emocional. Sua performance é essencial para entender o catalisador da transformação de Ruth. Bob é egoísta e narcisista, acreditando que pode descartar Ruth sem consequências. A trajetória de Bob serve como um lembrete da superficialidade das aparências e do perigo de subestimar aqueles que consideramos fracos.
Susan Seidelman dirige com um estilo visual vibrante e exagerado, que complementa o tom satírico da história. A utilização de cores vivas e cenários opulentos realça o contraste entre o mundo glamouroso de Mary e a vida comum de Ruth. A direção de Seidelman é instrumental em manter o equilíbrio entre o humor e a crítica social. Ela nos conduz através das várias fases da transformação de Ruth, desde a submissão e o desespero até a vingança e o empoderamento.
O roteiro de Barry Strugatz e Mark R. Burns é afiado e mordaz, fiel ao espírito do romance de Weldon. Os diálogos são cheios de humor negro e ironia, e a narrativa é hábil em desenvolver os personagens de maneira que suas ações, por mais extremas que sejam, parecem naturais dentro do contexto da história. A escrita ressalta a dualidade entre a vida idealizada e a realidade dura enfrentada por Ruth, tornando sua vingança uma jornada de autodescoberta.
Na época de seu lançamento, muitos críticos elogiaram a performance de Roseanne Barr, reconhecendo sua habilidade de transitar do humor televisivo para uma atuação mais complexa e cinematográfica. No entanto, alguns acharam que o filme não conseguia equilibrar completamente seus elementos cômicos com os aspectos mais sombrios da história. Meryl Streep, por outro lado, foi amplamente elogiada por sua versatilidade e capacidade de se destacar em um papel cômico, algo que não era comum em sua carreira até então.
“Ela é o Diabo” ganhou status de cult. O filme é apreciado por sua abordagem ousada e irreverente da vingança feminina e por sua crítica às normas sociais e de gênero. A transformação de Ruth é emblemática de uma jornada de empoderamento e resistência, ressoando com temas universais de autodescoberta e justiça pessoal. A maneira como o filme lida com a dualidade entre aparência e realidade continua relevante, oferecendo uma reflexão sobre a superficialidade das relações e a força interior que pode emergir diante da adversidade.
“Ela é o Diabo” é uma comédia que desafia e diverte, ao mesmo tempo em que oferece uma visão perspicaz das dinâmicas de poder e identidade. Roseanne Barr e Meryl Streep proporcionam performances inesquecíveis, e a direção de Susan Seidelman garante que o filme mantenha seu equilíbrio delicado entre o riso e a reflexão.