Há algo inerentemente sedutor na premissa de “Aqui”: um filme que transforma um espaço físico em protagonista, usando o tempo como a verdadeira narrativa. No entanto, a promessa dessa grandiosidade filosófica e técnica acaba esbarrando em uma execução que tropeça entre o tédio e a pretensão. Robert Zemeckis, conhecido por expandir as possibilidades do cinema com obras como “Forrest Gump” e “Uma Cilada para Roger Rabbit”, entrega aqui um espetáculo visual competente, mas emocionalmente descompassado.
O filme, baseado na graphic novel de Richard McGuire, apresenta um conceito instigante: tudo acontece na mesma sala, com a câmera imóvel observando gerações passarem, conflitos emergirem e memórias se sedimentarem nas paredes. Mas o que deveria ser um mosaico de histórias humanas e históricas acaba parecendo um álbum de recortes mal colados, em que cada cena luta para justificar sua relevância. O roteiro de Eric Roth, que já entregou trabalhos com alma em “O Curioso Caso de Benjamin Button”, aqui parece tão estático quanto a própria câmera.
Há, é claro, momentos de beleza e inteligência. As transições entre épocas são fluídas e engenhosas, uma dança delicada entre design de produção e edição. Zemeckis, fiel à sua tradição de brincar com a tecnologia, usa o rejuvenescimento digital com habilidade, especialmente nas performances de Tom Hanks e Robin Wright. “Foi como voltar no tempo”, disse Wright sobre o processo. E talvez seja esse o problema: “Aqui” se preocupa tanto em olhar para trás que esquece de construir algo que dialogue com o presente.
As performances são um dos pontos altos do filme. Hanks e Wright entregam interpretações nuançadas, revelando a intimidade e o peso de vidas ordinárias. Ainda assim, o próprio filme parece menos interessado no cotidiano desses personagens e mais obcecado em posicioná-los no epicentro de eventos históricos. Cada referência – uma televisão exibindo o noticiário ou uma conversa sobre a Grande Depressão – soa mais como um artifício do que uma parte orgânica da narrativa.
Zemeckis enfrenta o desafio técnico com maestria, mas é como se o filme estivesse mais interessado em provar que pode ser feito do que em justificar por que deveria existir. A direção, marcada por teatralidade e precisão, não é suficiente para compensar a falta de profundidade emocional e narrativa. Há ecos de ideias potentes, como a reflexão sobre quem permanece e quem parte ao longo da história, mas elas são enterradas sob camadas de pretensão histórica.
O maior problema de “Aqui” é que, embora sua proposta seja construir uma conexão universal entre passado, presente e futuro, o filme carece de paixão pela própria história. Não há um senso de urgência ou propósito, como se Zemeckis e Roth estivessem mais preocupados em desenhar a estrutura do que em preenchê-la de vida. Faltam os riscos emocionais que poderiam transformar a casa em algo mais do que um ponto de vista técnico.
No fim, “Aqui” é admirável por seu domínio técnico, mas incapaz de tocar os espectadores de forma genuína. As memórias estão todas lá, mas falta a alma que as faria pulsar e ressoar.
Nota: 3/5