Morreu nesta sexta-feira, 23, aos 81 anos, em Paris, o fotógrafo brasileiro Sebastião Salgado, uma das vozes visuais mais pungentes e respeitadas do século XX e início do XXI. A causa da morte foram complicações decorrentes de um quadro agravado de malária. A notícia foi confirmada por familiares e instituições culturais francesas.
Economista de formação e humanista por essência, Salgado redefiniu a fotografia documental ao longo de mais de cinco décadas de carreira, aproximando arte, denúncia e compaixão. Fez do preto e branco sua assinatura, da dor alheia seu alerta, e da esperança silenciosa o pano de fundo de cada imagem. Documentou a fome na África, os garimpos no Brasil, os campos de refugiados em Ruanda, as sombras tóxicas do Kuwait e os pinguins sobre o gelo, todos com a mesma intensidade ética.
Foi também o criador, ao lado da esposa Lélia Wanick Salgado, do Instituto Terra — projeto de reflorestamento e renascimento ambiental que transformou uma fazenda devastada no Vale do Rio Doce em uma reserva de vida. Plantar árvores, para Salgado, era restaurar o planeta. Fotografar era restaurar a dignidade.
“Já tive vergonha de ser fotógrafo. Já tive vergonha de fazer parte da espécie humana”, disse ele certa vez à Forbes, ao recordar os horrores testemunhados em Ruanda. Mas resistiu. Persistiu. E seguiu em frente com a câmera a tiracolo, mesmo quando as lágrimas embaciavam a lente.
No momento de sua morte, estava com uma grande retrospectiva em cartaz no centro cultural Les Franciscaines, em Deauville, na França, como parte do Ano França-Brasil. Seu legado, no entanto, não cabe em nenhuma galeria.
Sebastião Salgado não era apenas um fotógrafo. Era o espelho incômodo da humanidade e sua chance de redenção.